Um programa para 150 mil casas para arrendamento acessível e política social

2.2 Um programa para 150 mil casas para arrendamento acessível e política social

2.2.1. 100 mil casas para arrendar entre 150 e 500 euros

O problema:

A habitação tem sido o parente pobre do investimento público em Portugal, um setor sob intervenção pública indireta, assente na bonificação de juros. Estas opções tornaram o parque habitacional quase exclusivamente privado e extremamente vulnerável à especulação. O parque habitacional público é de apenas 120 mil alojamentos e situa-se nuns escassos 2% do total, quando a nível europeu a média é de 15%. A administração central provê apenas 11 mil destes fogos, menos de metade do que oferece o município de Lisboa (cerca de 25 mil).

Agravada pela política liberalizadora de PSD e CDS, assistimos nos últimos anos a uma aguda crise no setor. A promoção da aquisição face ao arrendamento continua a prevalecer.  O estímulo à aquisição de casa própria - 75% do total - atirou o  arrendamento para níveis muito baixos (19%) em termos europeus. O parque habitacional destinado ao arrendamento encontra-se sob enorme pressão da procura, nomeadamente em resultado do turismo e da especulação imobiliária. Já a aquisição de casa através do crédito levou a inúmeros incumprimentos, um drama para muitas famílias, para quem as dívidas se mantêm após a entrega de casa ao banco.

A nova Lei de Bases da Habitação prevê mudanças importantes, como o papel do Estado no garante do direito à habitação e a estruturação de instrumentos públicos para intervenção, mas não basta para estancar a financeirização em curso. É necessária nova legislação específica que assegure o direito a uma habitação adequada.

A resposta do PS:

Existe hoje uma Secretaria de Estado da Habitação, e mais recentemente um Ministério da Habitação. Desde 2017 que o governo desenvolveu um documento diretriz intitulado “Nova Geração de Políticas de Habitação”[1], que visa, entre outros objetivos, “aumentar o peso da habitação com apoio público na globalidade do parque habitacional de 2% para 5%, o que representa um acréscimo de cerca de 170.000 fogos” no prazo de oito anos (2026).

Dentro deste enquadramento foram desenhados programas públicos que visam responder a algumas destas necessidades, como o “1.º Direito” ou o “Programa de Arrendamento Acessível”, e mantidos outros como o “Reabilitar para Arrendar” ou “Porta 65 – Jovem”. De uma forma geral, porém, estes programas encontram-se muito atrasados e fragmentados, têm uma dimensão e financiamento reduzidos e não intervêm decididamente na liberalização e financeirização do mercado imobiliário. Para além disso, não estão direcionados prioritariamente para o arrendamento e assentam maioritariamente na concessão de benefícios fiscais ou subsidiação de renda dos mercados privados em detrimento de mecanismos de provisão, construção e reabilitação pública, e são amiúde pouco ambiciosos na definição dos “preços acessíveis” (atualmente definidos pelo governo como 20% abaixo dos valores de referência de mercado, o que continua a impedir o acesso de muitos agregados familiares). A experiência tem demonstrado que estes planos não respondem à emergência da habitação e à intervenção necessária no mercado habitacional totalmente liberalizado.

Neste mesmo contexto, o governo transpôs para a legislação nacional uma ferramenta que tem agravado a especulação imobiliária e a intervenção financeirizada nos ativos imobiliários, nomeadamente habitação, em outros países. Protege as Sociedades de Investimento e Gestão Imobiliária,  garantindo que, ao contrário de outros países, este instrumento em Portugal não se limita à habitação, mas pode ser utilizado em outras atividades económicas, como o Alojamento Local, alargando o privilégio fiscal a estes outros investimentos, já de si beneficiados relativamente ao arrendamento de habitação permanente.

Ou seja, os objetivos não serão atingidos e estas políticas manterão as rendas caras e um arrendamento raro e difícil. O PS acomoda os interesses do mercado financeiro e garante assim que as famílias pobres e de rendimentos médios serão sempre prejudicadas.

Propomos um programa destinado à provisão para arrendamento de 100 mil alojamentos adicionais a preços acessíveis (entre 150 e 500 euros por mês, em função das características e necessidades dos agregados familiares).

O Bloco propõe:

  • Prioridade à reabilitação urbana para habitação permanente ou arrendamento por tempo indeterminado, incluindo um programa que envolva a assunção pelo Estado dos custos da reabilitação dos alojamentos quando os proprietários não queiram ou não possam fazê-lo, seguida de colocação no mercado de arrendamento a preços acessíveis ao rendimento médio e baixo português até o valor ser ressarcido;
  • Uso de instrumentos da política de solos para conversão de edifícios habitacionais abandonados em habitação pública;
  • Onde necessário, construção pública de novos alojamentos integrados na malha urbana e evitando a reprodução de guetos;
  • Estímulos adicionais à colocação dos alojamentos existentes no mercado de arrendamento a preços acessíveis;
  • Penalização adequada da manutenção dos alojamentos em situação devoluta por motivos especulativos;
  • Limitação do Alojamento Local, com imposição do licenciamento como empreendimento turístico a todos os fogos habitacionais dedicados exclusivamente a esta atividade; imposição de quotas máximas de alojamento local por zona urbana, impedindo novos licenciamentos em zonas sobrecarregadas ou limitando-os à substituição de licenciamentos anteriores.

Neste contexto, propomos um programa destinado à provisão para arrendamento de 100 mil alojamentos adicionais a preços acessíveis (entre 150 e 500 euros por mês, em função das características e necessidades dos agregados familiares). Este plano de investimento consolidará os programas e iniciativas existentes, privilegiando a solução do arrendamento de longa duração, adotando uma definição consistente do que são “preços acessíveis” e combinando reabilitação pública de alojamentos existentes, construção de novos alojamentos e, se necessário, subsídio ao arrendamento de alojamentos privados.

  • Sim, é possível

  • Para estimação do custo deste programa, utilizamos como referência os custos estimados pelo IHRU para a provisão de soluções de realojamento para as 25.762 famílias identificadas no contexto do Levantamento Nacional das Necessidades de Realojamento Habitacional realizado em Fevereiro de 2018[2] (ver Tabelas em baixo).

  • O universo abrangido pelo levantamento do IHRU (famílias em situação de carência habitacional grave em todo o país) é bastante mais restrito do que aquele que o programa que aqui propomos pretende servir, mas o custo médio por família do respetivo realojamento (cerca de 60 mil euros por família) constitui um valor de referência para o custo estimado de um programa que abranja 100 mil alojamentos e cuja provisão assente numa combinação semelhante de soluções (reabilitação de habitações existentes, construção de novas habitações, aquisição de novas habitações). Por uma questão de simplificação, consideramos para esta estimativa apenas os custos das soluções que não o arrendamento de habitações pelo Estado, os quais representam custos anuais recorrentes. Temos assim um custo total de 1,5 milhões de euros associado à provisão de soluções de alojamento para 25.762-1.075=24.687 famílias, o que representa um custo médio de cerca de 60 mil euros por alojamento.

Custos e receitas da proposta:

Com base nos cálculos indicados ao lado, o custo estimado do programa que agora propomos será da ordem de 6 mil milhões de euros (100 mil alojamentos × 60 000 euros = 6 mil milhões de euros). Dividido pelos quatro anos da próxima legislatura, o custo de um tal programa terá assim um impacto orçamental estimado de 1 500 milhões de euros anuais × 4 anos, aumentando muito significativamente a provisão pública de habitação e mitigando consideravelmente as atuais dinâmicas de exclusão do acesso à habitação. Se a negociação europeia permitir uma comparticipação razoável, este custo direto pode ser substancialmente reduzido. Para além disto, existe a necessidade de revisão dos impostos sobre o património e respetivos benefícios fiscais que têm vindo a promover a especulação ou atividades especulativas e que são tremendamente valorizadas pela transformação de uso dos solos. São disto exemplo o Imposto Municipal sobre Transmissão Onerosa de Imóveis, que tem vindo a crescer em cerca de 20 pontos percentuais nos últimos 5 anos. Estes valores poderão apoiar a política municipal de habitação se não forem isentados, bem como poderão refrear os ímpetos especulativos das transações.

Por outro lado, assumindo uma renda mensal média de 350€ por alojamento, uma vez em pleno funcionamento o programa gerará receitas próprias estimadas no montante de 350 € x 12 meses x 100 mil alojamentos = 420 M€/ano.

O custo orçamental líquido poderá ser de cerca de 500 M€ durante cada um dos quatro anos, com uma comparticipação de fundos de coesão a metade, havendo um encaixe líquido de 420 M€ a partir de então, uma vez realizada a despesa infraestrutural. Ou seja, o Estado terá recuperado todo o seu investimento a partir do 5.º ano do programa (ou um pouco depois, consoante os juros considerados).

O programa incluirá ainda a possibilidade de o Estado se substituir a proprietários que não tenham recursos e cujas casas sejam recuperadas pelo fundo público, sendo depois alugadas até à recuperação do investimento. Desse modo, os proprietários modestos ficarão protegidos da pressão das agências financeiras e imobiliárias para uma venda precipitada e recuperarão a sua propriedade modernizada.

Vantagens sociais da proposta:

Ao incidir prioritariamente sobre a reabilitação urbana de prédios degradados do Estado ou de outras entidades públicas (através de protocolos com as Misericórdias ou outras associações) este programa garante dois tipos de benefícios às famílias: a renda é baixa; a renda baixa torna possível o regresso de famílias com rendimentos baixos e médios de jovens aos centros das cidades, onde se concentram as reabilitações de habitação, com a redução de tempo e custos de transporte.

Estes benefícios representam para as famílias de rendimentos baixos e médios e para os e as jovens um valor agregado superior a 200 milhões de euros por cada ano no aluguer das habitações.

Este programa tem ainda um significativo impacto ao nível do emprego, dado o caráter intensivo em mão de obra dos setores diretamente envolvidos (construção e reabilitação urbana), que se pode estimar entre 50 e 70 mil postos de trabalho neste período.

Este programa garante dois tipos de benefícios às famílias: a renda é baixa; a renda baixa torna possível o regresso de famílias com rendimentos baixos e médios de jovens aos centros das cidades.

2.2.2. Recuperar e construir 50 mil fogos para habitação com renda condicionada/apoiada

Com escassas exceções, a provisão direta pelo Estado (em geral definida e aplicada ao nível das autarquias) tem-se limitado principalmente ao segmento da habitação social de mais baixo custo e mais baixa qualidade (de construção, arquitetónica e urbanística), levada a cabo no contexto de programas como o Programa Especial de Realojamento lançado em 1993, que levou ao realojamento de cerca de 45 mil famílias, embora criando ou mantendo lógicas de guetos. Este Programa nunca chegou a estar concluído e manteve lógicas de gueto com as quais lidamos ainda hoje. Em 2017, quase 26 mil famílias viviam em condições precárias ou indignas. Estes programas devem responder às carências da população mais desprotegida e promover a inclusão urbana, reforçando assim as condições sociais para a escolarização das crianças, para a promoção da segurança de quem neles habita e para a qualidade de vida de toda a comunidade.

[1] Online em: https://www.portugal.gov.pt/download-ficheiros/ficheiro.aspx?v=95621259-fdd4-4099-82f3-2ff17c522882
[2] Disponível em: https://www.portaldahabitacao.pt/opencms/export/sites/portal/pt/portal/habitacao/levantamento_necessidades_habitacionais/Relatorio_Final_Necessidades_Realojamento.pdf

Participa
Quero receber as notícias do Bloco:
no whatsapp
no email
Ao recolher os teus dados para a sua lista de divulgação, o Bloco de Esquerda assegura a confidencialidade e a segurança dos mesmos, em cumprimento do RGPD, garante que nunca serão transmitidos a terceiros e apenas serão mantidos enquanto desejares, podendo solicitar-se alteração ou cancelamento através do e-mail Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.
Programa eleitoral
2019-2023
  • R. da Palma, 268
    1100-394 Lisboa, Portugal

  • E | Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.

    T | (+351) 213 510 510

segue-nos